Por Luna do Cairo
Eu teria feito esse
post na semana passada, mas tenho estado enlouquecidamente ocupada. E peço
desculpas com antecedência, porque não vou deixar de falar de tabus. Se você
tem algum, não leia.
Sinto como se tivesse acabado de acordar de um pesadelo. Só
que esse pesadelo continua enquanto estou acordada. Islamitas venceram as
eleições para a presidência do Egito honestamente. E isso depois de ganharem
70% do (agora dissolvido) parlamento. Sem querer dar uma de chata, mas eu bem
que avisei.
Bem antes dessa dita revolução, eu sabia que os fanáticos
religiosos eventualmente chegariam ao poder. Era apenas uma questão de tempo.
Acho que o fato de ter estudado sobre o Oriente Médio em Harvard é o
responsável pela minha previsão política. Mas, sinceramente, qualquer um com
meio neurônio podia ter chegado à mesma conclusão. Os sinais estavam muito
claros. O Egito estava no ponto certo para a islamização já há algum tempo. Só
tínhamos que reparar no número crescente de mulheres usando véu e homens de
barba, no analfabetismo, na pobreza e no desemprego pandêmicos para chegar a essa
conclusão. Se essa não é a receita perfeita para um governo islâmico, eu não
sei qual seria.
Nada disso estaria acontecendo se não fosse pela recém
descoberta “democracia” do Egito. Com isso em mente, me sinto com vontade de
ser politicamente incorreta. Beirando o limite do ofensivo. Tenho vontade de
fazer você reavaliar os seus conceitos mais queridos sobre democracia, direitos
humanos, religião, violência, e mais do que tudo, essa imerecidamente chamada
de sagrada “revolução”.
E aqui vai...
Fanáticos religiosos com aspirações políticas devem ficar
atrás das grades, e não num governo. A razão não é necessariamente que eles
tenham cometido crimes (apesar de ser verdade em muitos casos). É porque a
ideologia islamita é por si só criminosa. Ao lado do nazismo. Mesmo que seja
religiosa, ao invés de racial, o Islamismo ensina uma supremacia que é perigosa
para a humanidade. Ele ensina que a forma Islâmica de governar é a única forma de se obter justiça e
prosperidade, e que ela deve ser alcançada a qualquer custo. E aqueles que são
contra – tanto não-muçulmanos quanto muçulmanos, são infiéis e que devem ser
tratados como tal.
Assim como no nazismo, o principal objetivo do Islamismo é a
dominação mundial. Atingida não apenas matando-se os infiéis (o equivalente às
raças não-arianas no nazismo), mas através da constituição do califado, e é
claro, da conversão. É por isso que uma interpretação tão patológica da
religião traz riscos para as minorias, os muçulmanos liberais, mulheres,
crianças, e os pobres. Realmente, com a exceção da Turquia (que, desculpem, não
é islamita de verdade), em todos os lugares onde eles chegaram ao poder, os islamitas
começaram a cortar publicamente as cabeças e as mãos das pessoas, apedrejar
mulheres que cometem “crimes” sexuais, patrocinar atentados terroristas ao
redor do mundo, perseguir minorias religiosas e sexuais, destruir locais
considerados patrimônios da humanidade que não sejam Islâmicos. Isso é muito
pior do que Mubarak, sem dúvida.
É por isso que precisamos perguntar a nós mesmos: o mundo realmente precisa de um Egito islamita?
Além da Arábia Saudita, Irã, Paquistão, Afeganistão, Iraque, Nigéria, e agora
Tunísia e Líbia?
Eu acho que não... a não ser que você seja um animal
zangado, cabeludo, que odeia mulheres, homofóbico e sádico que gosta de ver os
outros sofrerem. Ou uma mulher que sofreu de uma séria lavagem cerebral. Ou
então, que você seja um liberal promotor da democracia, que não sabe nada de
democracia nem no seu próprio país. :) Dado que você não pertence a nenhuma
dessas categorias, eu acho que você vai concordar que é mais sábio e preferível
aplicar a justiça contra esses meliantes, do que dar a eles uma outra chance de
provar o quão vis eles são.
Espera. Você quer argumentar que a Irmandade Muçulmana é
composta por indivíduos bem educados que estão mais interessados em ganhar
dinheiro do que em qualquer outra coisa. E daí? Educação e fanatismo religioso
não são mutuamente excludentes. Só porque alguém é engenheiro não quer dizer
que ele não queira destruir as suas liberdades ou impor castigos corporais.
Falando de educação, eu acho que vale notar que os islamitas
são exclusivamente educados em ciências exatas, como física, engenharia ou
medicina. Você nunca vai encontrar um fanático religioso com diploma em
ciências humanas, como escrita criativa, ciência política, filosofia etc.,
disciplinas em que a) alguém deveria ter familiaridade antes de governar um
país, b) promovem os direitos humanos e são anti-religiosas, com uma boa razão.
Mais importante, antes que se esqueça, é que a Irmandade
Muçulmana foi exposta ao processo eleitoral. Eles perceberam que eles precisam
parecer mais “moderados” para não assustar os eleitores. Isso se chama mentir. Se você não acredita em mim, é
só ver como as posições da Irmandade foram, ah, “evoluindo” conforme foi chegando perto das eleições. Dê uma olhada
nas tantas vezes em que eles mentiram sobre as suas intenções, mais notadamente
sobre não querer dominar o Parlamento. Ah, e sobre não querer nomear um
candidato à presidência.
Eu tenho mais respeito pelos Salafistas “linha dura”. Ao
menos eles não mentem. Eles são diretos ao ponto e dizem que eles querem
transformar esse lugar numa Arábia do séc.VII (ou uma Arábia moderna, dá no
mesmo). Diferentemente de alguns Irmãos mais espertos politicamente, eles são
estúpidos o suficiente para nos deixar saber contra o quê estamos lutando.
Por causa do histórico assustador dos islamitas ao redor do
mundo, eu apoiei completamente a dissolução que os militares fizeram do
Parlamento mês passado. Cara, eu estava até torcendo que eles manipulassem as
eleições para que o secular Ahmed Shafiq ganhasse. Isso é tão antidemocrático
da minha parte, você deve estar pensando. E você está certo. No Egito, eu não
sou democrática. Contrariamente do que eu aprendi nas minhas aulas sobre
direitos humanos lá em casa, eu NÃO acredito que todas as pessoas tenham
direito a autodeterminação (N.T.: autodeterminação: direito de um grupo de
pessoas em determinar se querem fazer parte do estado ou de um movimento), isto
é, à democracia. Não quando há uma grande chance de que eles, em sua santa
ignorância, coloquem fanáticos no poder.
Porque, veja, eleger um governo é uma grande
responsabilidade. É algo que afeta a vida de milhares de pessoas dentro e fora
das suas fronteiras. É por isso que não deveria ser cedida para patetas e
idiotas. No Egito, onde mais da metade da população é analfabeta e quase todo o
mundo é religioso, a autodeterminação leva os islamitas a chegar ao poder. Por
que deveríamos permitir que uma população, na sua maioria sem educação, coloque
esses criminosos no poder? Por que eles querem? Diabéticos querem açúcar e
alcoólatras querem álcool, mas isso não significa que seja bom pra eles. Por
que deveríamos permitir que uma população, que pode ser facilmente intimidada a
votar em candidatos religiosos, possa determinar como o resto de nós deverá
levar as nossas vidas? Por que, afinal de contas, é uma democracia, e isso é a
coisa mais importante do mundo?
Então talvez seja a hora de acabar com a democracia...
Os liberais egípcios – você sabe, os responsáveis por toda
essa bagunça – conseguiram inverter as suas prioridades. Ao invés de lutar por
segurança e prosperidade, eles lutaram por democracia. GRANDE erro. Democracia
não é o mesmo que essas coisas, nem as garante.
Claro, existe uma alta correlação entre elas, mas não necessariamente uma conexão.
Estabilidade e prosperidade são objetivos.
Democracia é uma forma de atingir
esses objetivos. Um processo.
Os liberais cometeram o erro de fazer da democracia o
objetivo. Eles não conseguiram perceber que porque é um processo, ela pode
trazer uma variedade de resultados. Em sociedades com população alfabetizada,
um nível satisfatório de educação, e de secularismo, a democracia traz paz,
prosperidade e estabilidade. Mas em sociedades com as chagas do analfabetismo e
da religião, a democracia traz fanatismo religioso, conflitos civis,
sectarismo, e um monte de outras mazelas que prefiro não mencionar.
Sabendo disso, porque diabos alguém gostaria de apoiar a
democracia no Egito?!?
Ah, mas veja bem, a palavra chave aqui é sabendo. Para o detrimento da nação, os
liberais egípcios não sabiam disso.
Eles não sabem nada sobre democracia,
e sabem muito menos ainda sobre a sua própria nação. Eles não sabem o quão profundamente religioso e
sem educação é o Egito. Mas, sério, o que mais se poderia esperar? Eles não
vivem no Egito, vivem no Facebook. Eles não falam árabe, falam arabinglês. Eles
bebem e festejam em casas noturnas de estilo ocidental, e fazem compras no City
Stars. Eles freqüentam escolas americanas. Pelo amor de Deus, EU sou mais egípcia do que eles!
Nunca vou me esquecer daquela despedida de solteira onde
dancei no mês passado. As meninas que me contrataram eram ricas e super
liberadas. Crème de la crème. Entre os pênis e bonecos de homens nus infláveis,
tinha muita coisa para se admirar. Mas nada me espantou tanto quanto a garota
egípcia que veio falar comigo depois do show e me perguntou em árabe, com um
forte sotaque americano, se eu tinha visto a bolsa dela. Vendo o quão ruim era
o seu árabe, eu disse a ela que falava inglês. Aliviada, ela começou a falar
comigo num inglês impecável. Eu contei para ela que era americana, e não
egípcia, mas que trabalhava como bailarina de dança do ventre aqui. Ela me
disse que nasceu e foi criada no Egito, e que freqüenta a universidade
americana.
A menina era simpática, mas dá para ver como esse tipo de
pessoa pode ficar sem contato com a realidade? Dá para perceber o porquê que
pessoas que vivem protegidas nos seus ninhos de elite não devem começar
revoluções em nome de um povo com quem eles não têm nada em comum?
E se começar essa maldita revolução não fosse o suficiente,
esses chamados liberais ainda cometeram outro erro grave: soltaram um monte de
islamitas da cadeia. Eles achavam que essa seria uma boa forma de aumentar os
seus aliados para intimidar ainda mais o Conselho Supremo das Forças Armadas
(SCAF em inglês) a abrir mão do poder. Eles também queriam tirar proveito da
popularidade da Irmandade Muçulmana.
E foi assim que a revolução egípcia se transformou na
revolução iraniana. Foi isso que
colocou um ponto final na revolução egípcia e a tornou um pesadelo islamita.
Não o SCAF.
Talvez o maior erro dos liberais depois de pedir por
democracia tenha sido permitir que esses loucos pudessem se candidatar.
Islamitas não são democratas. Eles são teocratas. Eles acreditam na imposição
da Shariah, que vai contra as noções modernas dos direitos humanos (e sua
legislação). Eles podem estar no jogo da democracia agora, mas o seu objetivo
principal não tem nada a ver com democracia. E é por isso que eles deviam ter
sido proibidos de participar das eleições em primeiro lugar.
O SCAF percebeu isso, mesmo que um tanto tarde. Foi por isso que eles dissolveram o
parlamento islamita pouco antes das eleições. E é por isso que eles estavam
cogitando a possibilidade de entregar a presidência para Shafiq, apesar de,
obviamente, isso não ter acontecido. Eles ficaram com medo. Os islamitas
ameaçaram se envolver em atos de violência se Morsi não ganhasse as eleições!
Na verdade mesmo, eles ficaram tão assustados que eles teriam dado a
presidência ao Morsi mesmo que ele não tivesse ganhado, que é o que muita gente
diz que aconteceu.
Isso se chama conciliação, e é perigoso. É o que alimentou a
megalomania de Hitler, e é o que atualmente está encorajando os islamitas. O
exército pode achar que está mantendo
a paz dessa forma, mas o que ele não percebe é que está apenas postergando a
violência. O derramamento de sangue é inevitável. Chegará um momento em que os
fanáticos irão realmente enfurecer ou o exército ou o povo, e as coisas vão
ficar feias. Feias de verdade. Nesse
momento, já será tarde demais. Os islamitas terão consolidado o seu poder,
acumulado muito mais armas, e aumentado os seus números. O Egito vai acabar
igual à Síria.
Quanto mais o exército esperar, mais sangrentas as coisas
vão ficar quando a merda começar a feder. É por isso que eles deviam ter
entregado a presidência a Shafiq, mesmo que as coisas ficassem um pouco
violentas. É como um relacionamento não saudável. Você sabe que o melhor pra
você é terminar com ele, mas tudo o que você pode fazer é pensar é em quão
doloroso será isso. Então, você fica no relacionamento, sem pensar em quão mais doloroso será terminar no futuro,
quando vocês dois estiverem ainda mais envolvidos emocionalmente. No caso do
Egito, não é a questão do exército e dos islamitas se aproximarem (apesar de
que isso poderia acontecer à moda do Paquistão), mas sim dos islamitas ficarem
mais apegados ao poder e às armas. É por isso que o exército deveria terminar
esse relacionamento AGORA. Teria sido doloroso, mas também teria dado uma boa
desculpa para se livrar de uma vez dos islamitas, colocando-os de volta na
cadeia, prevenindo futuros desastres.
O que eu acho mais interessante é a reação dos egípcios a
tudo isso. Por um lado, tem aqueles que estão voluntariamente e prematuramente
se “saudificando”. Nem posso contar quantas mulheres estão agora utilizando
roupas ninjas, e quantos homens deixaram suas barbas crescerem nos últimos
meses. E agora que Morsi entrou no gabinete, eles estão começando a pressionar.
Não tem nem duas semanas que Morsi “ganhou” a presidência, e as pessoas já
estão abertamente fazendo pressão para que as mulheres se cubram e ajam de
forma mais islâmica.
Por outro lado, tem os egípcios que votaram no Shafiq. A
reação deles é muito intrigante. Os mesmos muçulmanos e cristãos que estavam morrendo de medo de uma vitória da Irmandade
Muçulmana estão agora me chamando de maluca por pensar que algo ruim vai
acontecer. Mas hein?!? Como assim?
Como você passa de aterrorizado antes das eleições para totalmente à vontade
depois? Por acaso você engoliu o discurso sobre tolerância e inclusão do Morsi?
Ele tranquilizou os seus temores tão lógicos? Ou estão todos vocês
inconscientemente transformando os seus medos em negação otimista porque seus
espíritos cansados não aguentam mais a realidade? Vocês realmente acreditam que podem voltar à Praça Tahrir e se livrar da
Irmandade da mesma forma que se livraram de Mubarak? Será que o seu excesso de
confiança faraônico levou a melhor? Vocês não percebem que os islamitas têm
talento para perdurar? E que a única forma de se livrar deles é fazer outro
país como os EUA fisicamente expulsá-los? ...(depois de eles mesmos os terem
colocado lá, é claro :D)
Eu não gosto de ficar apontando dedo, mas dessa vez eu vou
apontar. E vou começar apontando o meu dedo para os tão chamados “liberais” que
colocaram em risco o bem estar de toda uma nação.
Primeiramente, a grande maioria desses tão chamados
“liberais” não merecem tal título. Não votar nem em Shafiq nem em Morsi não faz
de vocês liberais. Faz de vocês uns idiotas. Apoiar os fanáticos porque eles
são a sua única opção contra o “Mubarakismo” não faz de vocês liberais. Faz de
vocês uns covardes. Salvar a “revolução” entregando o seu país para nazistas
religiosos não faz de vocês liberais. Faz de vocês traidores. E vocês deveriam
ser enforcados por causa disso. Mas o mais provável é que vocês façam as suas
malas e fujam para a Amériiica, porque não querem deixar a barba crescer ou
cobrirem o rosto. E porque vocês não querem se incomodar revidando. Vocês são
bons demais para arrumarem a sua própria bagunça. Vocês são crianças mimadas e
abastadas que estão acostumadas com os outros fazendo de tudo para vocês.
Segundo, não há revolução. Os “liberais” não começaram uma
revolução. Eles apenas copiaram a Tunísia e depuseram o seu presidente. Macaco
vê, macaco copia. Na verdade, nem isso eles fizeram. Foi o exército que deu o
ultimato a Mubarak. Não porque o exército e o povo estivessem unidos, como no
enganoso slogan, mas porque os generais não queriam o filho de Mubarak, Gamal,
como o seu comandante. Eles não queriam um filhinho de papai que não tem
respeito pelas forças armadas dando ordens para eles. Se o interesse do povo e
das forças armadas não tivesse coincidido, esse lugar teria sucumbido a uma
guerra civil. Os “liberais” precisam entender isso e parar de se vangloriarem
pela queda de Mubarak.
Agora que eu tirei esse peso de mim, gostaria de terminar
deixando uma coisa para pensar. Os egípcios parecem sofrer de algum tipo de
complexo de inferioridade cultural. A elite copia o Ocidente com suas calças
jeans, música Techno e “democracia”, enquanto o povão quer ser como os
sauditas, com suas barbas e roupas ninja. Para o meu completo horror, essas
duas partes se uniram e criaram um governo democraticamente eleito que vai
rapidamente virar Saudita. A parte triste disso tudo é que é desnecessário. O
Egito tem uma das culturas mais maravilhosas, lindas e ricas do mundo. Ela não
é apelidada de “Um il-dunya”, Mãe do Mundo, sem motivo. Ela tem mais de
7 mil anos de história. Nem o Ocidente nem a Arábia Saudita chegam perto disso.
Eu gostaria que os egípcios tivessem orgulho disso. Eu gostaria que eles
parassem de procurar inspiração no exterior. No dia em que isso acontecer, aí
sim nós poderemos dizer honestamente que houve uma revolução.
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Esse texto é de autoria exclusiva da Luna do Cairo e o Ventre da Dança não concorda com todas as colocações aqui expostas. O trabalho mostrado aqui é uma tradução direta do texto original.
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